RESTAURAR A NOSSA CASA COMUM: DECLARAÇÃO PARA ESTOCOLMO+50

A Humanidade numa encruzilhada – Rutura ou Evolução

A terrível situação ecológica do planeta e os desafios enfrentados pelas presentes e futuras gerações são cada vez mais evidentes. Jovens protestam nas ruas e nos tribunais, e ecoam apelos para uma profunda transformação e renovação em todos os sectores da sociedade. A 8 de Outubro de 2021, o Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas (CDHNU) reconheceu o “direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável”. Para este direito poder ser implementado, são necessárias mudanças estruturais ao nível jurídico, económico, social, político e tecnológico, que tornem possível restaurar o bom estado de funcionamento do Sistema Terrestre1. A consciência da nossa interdependência global deve dar origem a uma nova lógica do que nos é comum, redefinindo e reconhecendo os bens comuns globais que suportam a vida na Terra – o sistema planetário que nos une a todos e do qual todos nós dependemos. Este é um passo fundamental para o desenvolvimento de um sistema de governação que permita gerir de forma eficaz as interações humanas com o Sistema Terrestre. Cinquenta anos após a Conferência de Estocolmo sobre o Ambiente Humano de 1972, os signatários desta Declaração da sociedade civil apelam às Nações Unidas, às suas agências, e a todos os Estados-Membros para trabalharem num percurso de quatro passos fundamentais para tornarem possível a necessária uma mudança de paradigma.

1 – Implementar o Direito a um Meio Ambiente Saudável.
Os Estados Membros devem implementar a Resolução 48/13 do CDHNU que reconhece este direito. Isso requer reconhecer e agir sobre a equidade intra e intergeracional que, por sua vez, exige que os princípios sejam progressivos e incluam obrigações de não regressão – por exemplo, consagrando uma agenda de “regeneração”- em todas as esferas do direito ambiental. A não-regressão deve impedir a erosão da proteção, enquanto os princípios de regeneração e progressão garantirão que as leis e regulamentos ambientais avancem consistentemente em ambição e eficácia. Implica garantir direitos ambientais processuais, incluindo o acesso à informação, participação pública e acesso à justiça. O direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável (em si mesmo um bem público global fundamental) só pode ser alcançado se o sistema compartilhado de suporte da vida – o Sistema Terrestre – for protegido como um único todo indivisível.

2 – Reconhecer, Restaurar e Salvaguardar os Bens Comuns Globais.
O primeiro passo para ser possível gerir com sucesso um bem comum, é defini-lo e reconhecê-lo. Isso facilitará o estabelecimento de um quadro de governação ambiental global verdadeiramente eficaz, consistente com a indivisibilidade do sistema natural que suporta a vida neste planeta. Um Sistema Terrestre num bom estado de funcionamento, mantendo a humanidade no “espaço operação seguro”, dentro de todos os limites planetários vitais e interdependentes, deve ser reconhecido como um bem comum global fundamental que necessita de uma gestão urgente. Por conseguinte, deve ser legalmente reconhecido como o “Património Comum da Humanidade”. Um clima estável é uma manifestação do bom funcionamento do Sistema Terrestre, e este fator estrutural é muito mais do que “Preocupação Comum da Humanidade”, tal como expresso no Acordo de Paris. Devido à urgência da crise climática, o reconhecimento de um clima estável como património comum deve tornar-se a prioridade central na discussão da “Nossa Agenda Comum”(OCA).

3 – Construir uma Economia Regenerativa.
O nosso sistema económico apenas reconhece como “criação de riqueza”, o consumo de recursos naturais físicos, apesar de isso implicar a destruição de infraestruturas naturais. Um futuro próspero requer uma economia em que os processos naturais que suportam toda a vida na Terra e asseguram a manutenção de um clima estável se tornem economicamente visíveis. O reconhecimento do Sistema Terrestre e de um clima estável como “património comum” permitirá a valorização adequada destes benefícios para as sociedades humanas, que hoje em dia são considerados meras “externalidades”. Este reconhecimento, proporcionará um suporte jurídico e um catalisador para a construção uma economia regenerativa e um sistema de governação capaz de restaurar e manter um clima estável e assegurar a manutenção de outros limites do planeta vitais.

4 – Priorizar a Governação e Soluções Institucionais.
A governação dos bens comuns globais a longo prazo, a provisão de bens públicos globais e a gestão dos riscos públicos globais, requerem um sistema permanente de governança capaz de gerir de forma eficaz as nossas interações com o Sistema Terrestre como um único todo. Por exemplo, a proposta para reestruturação e reativação do Conselho de Tutela das Nações Unidas foi já amplamente discutida, incluindo no mais recente relatório do Secretário-Geral das Nações Unidas intitulado “A Nossa Agenda Comum (OCA)”. O relatório OCA apela a uma Declaração para as Gerações Futuras e salienta a conveniência de transformar o Conselho num espaço multilateral para a governação dos bens comuns e de dar voz aos interesses das gerações futuras. Garantir uma governação ecológica global adequada e reforçar os atuais quadros institucionais fragmentados, tornando-os inclusivos, representativos e responsáveis perante os cidadãos globais, deve ser uma prioridade central para a comunidade internacional.